Alyne Pimentel morreu aos 28 anos,grávida de 6 meses,após passar cinco dias pedindo socorro — Foto: Reprodução/Centro Brasileiro de Estudos da Saúde
GERADO EM: 12/09/2024 - 04:30
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Nesta quinta-feira,o presidente Luiz Inácio Lula da Silva participa da cerimônia de lançamento da Rede Alyne,um programa do Ministério da Saúde,voltado ao cuidado integral de gestantes e bebês,em Belford Roxo,na Baixada Fluminense. O programa antes chamado de Rede Cegonha foi rebatizado e homenageia Alyne da Silva Pimentel Teixeira,uma jovem negra,residente na Baixada Fluminense,que morreu aos seis meses de gravidez,em 2002 em decorrência da negligência durante o atendimento. Na primeira etapa de implementação da Rede Alyne,serão investidos,segundo a União,R$ 4,85 bilhões para beneficiar 30 milhões de mulheres no país.
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A estratégia do Ministério da Saúde é promover um modelo de cuidado humanizado e integral para a saúde da gestante,parturiente,puérpera e da criança,observando as desigualdades étnico-raciais e regionais,que historicamente impactam as condições de saúde das mulheres mais vulneráveis. O programa reforça também a importância do atendimento de pré-natal,da realização de exames e vinculação da gestante a uma maternidade de referência para o parto.
A morte de Alyne,em 2002,expôs as falhas estruturais do sistema de saúde e levou a Organização das Nações Unidas (ONU) a responsabilizar o Estado brasileiro pela morte de Alyne,que poderia ter sido evitada.
Segundo dados da pesquisa Nascer no Brasil,publicada pelo Ministério da Saúde em 2023,a taxa de mortalidade de mães negras é duas vezes maior que a de brancas. Enquanto,a mortalidade de mulheres brancas é de 46,56 por 100 mil nascidos vivos,entre as mulheres negras esse número mais do que dobra,chegando a 100,38.
A Rede Alyne faz parte de um das políticas públicas adotadas pelo governo federal na área da saúde que está alinhada a um dos compromissos assumidos pelo Brasil junto às Nações Unidas que pretende reduzir o número de casos de mortes de parturientes até 2030. A meta é que esse número chegue a 30 por 100 mil/habitantes.
Alyne,então com 28 anos,estava grávida de seis meses quando começou a passar mal em 11 de novembro de 2002. Buscando atendimento médico,foi à Casa de Saúde Nossa Senhora da Glória,onde foi medicada e enviada de volta para casa. Dois dias depois,retornou ao hospital em pior estado,mas,após mais de sete horas de espera,o bebê já estava morto. Alyne foi submetida a um parto induzido para retirada do feto,mas partes do feto permaneceram no útero,agravando sua condição. Somente no dia seguinte o procedimento para remoção das partes foi iniciado,mas a demora foi fatal. Cinco dias depois,Alyne morreu.
Para a Rede Nacional Feminista de Saúde o drama de Alyne simboliza a violência da mortalidade materna evitável no Brasil,causada pela obstétrica e racismo institucional que evidenciam a negligência médica e a precariedade do sistema de saúde público no Brasil.
O caso ganhou notoriedade internacional quando,em 2011,a Convenção sobre a eliminação de todas as formas de discriminação contra as mulheres da ONU condenou o Brasil por não fornecer o atendimento adequado à gestante,determinando que o país indenizasse a família e implementasse medidas para evitar que casos como esse se repetissem.
Além disso,o Comitê recomendou a melhoria dos serviços de saúde materna,a capacitação adequada dos profissionais de saúde e a criação de mecanismos de fiscalização mais rígidos para garantir o cumprimento dos direitos reprodutivos.
Solenidade de reparação à família de Alyne Silva Pimentel Teixeira — Foto: Agência Brasil
Apenas em 2014,12 anos após a morte de Alyne,o governo federal indenizou sua família. Na ocasião,uma cerimônia simbólica foi realizada em Brasília,onde a mãe de Alyne,Maria de Lourdes da Silva Pimentel,recebeu uma placa em homenagem à sua filha,que foi fixada no hospital onde ela morreu. A compensação financeira foi de US$ 55.137 (cerca de R$ 130 mil). No entanto,a reparação cível para a filha de Alyne só foi concluída em 2021,após 19 anos de espera,já depois da morte de Maria de Lourdes,vítima da Covid-19.
De acordo com as outras recomendações da ONU,o Brasil deve garantir o direito das mulheres a uma maternidade segura e o acesso adequado aos procedimentos obstétricos; proporcionar a formação profissional adequada aos trabalhadores de saúde; assegurar a observância de parâmetros nacionais e internacionais de saúde reprodutiva nos serviços públicos de saúde; e punir os profissionais de saúde que violem os direitos reprodutivos das mulheres e seu direito de acesso à saúde.
© Reportagem diária do entretenimento brasileiro