Usinas a carvão respondem por um terço da eletricidade gerada no planeta — Foto: Michel Filho/Agência O Globo
GERADO EM: 20/09/2024 - 04:00
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No próximo dia 30 será desligada a última usina de carvão que gera eletricidade para o Reino Unido,berço da revolução industrial e da primeira usina desse tipo no mundo,inaugurada em 1882. Sinal do compromisso do país em descarbonizar seu sistema elétrico,o carvão,que na década de 1980 chegou a representar 80% da energia do Reino Unido,hoje responde por cerca de 1%,com 33% vindos de eólicas e solares.
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Se os países industrializados avançam,o esforço para o uso de fontes mais limpas ainda é longo,o que abre oportunidades para o Brasil,cuja matriz elétrica é formada por mais de 80% de fontes limpas,bem acima da média mundial,de 29%. A pobreza energética está no centro desse desafio.
O número de pessoas sem acesso à eletricidade no mundo é alto: mais de 700 milhões de pessoas vivem sem luz,sendo boa parte na África,cujas florestas são um ativo ambiental importante em um mundo que sente os efeitos das mudanças climáticas. A pobreza energética pode ser retratada com outros indicadores. Cerca de 500 milhões de pessoas têm acesso à eletricidade,mas não têm equipamentos elétricos,segundo o Banco Mundial (Bird). Mais de 2 bilhões de pessoas cozinham ou esquentam suas casas com lenha ou outros tipos de biomassa.
O carvão ainda responde por cerca de um terço da eletricidade gerada no planeta,sendo que a China,apesar de hoje ser líder em investimentos em fontes renováveis,ainda responde por cerca de metade do seu consumo. A Alemanha,maior potência industrial europeia,ainda tem 27% de sua energia gerada por carvão (em 2000,eram 52%).
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Dados do Bird apontam que,para adotar energia mais limpa e universalizar os serviços,os países em desenvolvimento terão de aumentar em sete vezes os investimentos em energia,para até US$ 2 trilhões anuais até 2030,sendo que dois terços dos recursos terão de vir do setor privado. Para preparar o mundo para a transição energética,estudo da BNEF indica que a rede de energia elétrica mundial terá de duplicar em comprimento até 2050,para atingir 152 milhões de quilômetros — aproximadamente a distância entre a Terra e o Sol. Alcançar isso exigirá cerca de US$ 21 trilhões em investimentos até 2050.
As mudanças climáticas impõem o desafio de mitigar os efeitos do aquecimento global e reforçar inclusão social,aumento da renda e acesso a novos serviços e produtos. As alta temperaturas deverão aumentar a demanda da população mais carente por equipamentos que proporcionem conforto térmico,como climatizadores e umidificadores e condicionadores de ar.
— Consequentemente,o valor das contas de luz também deverá aumentar,retornando o ciclo de desigualdade que acompanha a transição energética em curso — avalia Elaine Cristina Silva dos Santos,pós-doutoranda do Instituto de Estudos Avançados da USP.
Visto que as contas de luz já são um dos itens que mais pesam no orçamento das famílias brasileiras e o percentual da renda destinada ao pagamento é elevado,tornar o setor elétrico mais preparado para os efeitos extremos do clima exigirá uma nova alocação de riscos e custos. Será preciso equilibrar o retorno das empresas com o bolso dos consumidores.
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Para entender os efeitos no setor de transmissão até 2050,a Companhia de Transmissão de Energia Elétrica Paulista (ISA CTEEP) contratou a consultoria Way Carbon. A ideia é mapear as áreas mais sensíveis e discutir como criar uma regulação que trate da resiliência climática.
—Temos de entender se pode haver uma reconfiguração do traçado das linhas ou se é preciso algum reforço não previsto —diz o presidente da empresa paulista,Ruy Chammas.
Ventos extremos causam danos às linhas de transmissão e podem provocar queda de árvores,estiagens severas afetam a geração das hidrelétricas,queimadas podem trazer impactos nas torres de transmissão,enchentes podem inundar subestações. Os equipamentos foram desenhados sob um outro contexto,o que exigirá repensar tecnologias.
— Os eventos extremos estão ficando mais frequentes,o que leva à discussão de alocação de custos e riscos. Como as políticas públicas serão criadas? Como projetar e custear linhas mais robustas? — questiona Ricardo Cyrino,presidente da Evoltz e do Conselho de Administração da Associação das Transmissoras de Energia Elétrica (Abrate).
© Reportagem diária do entretenimento brasileiro