Os assassinos confessos da vereadora Marielle e Anderson,os ex-policiais militares Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz — Foto: Reprodução
GERADO EM: 18/09/2024 - 05:01
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Os réus confessos do homicídio da vereadora Marielle Franco (PSOL) e do motorista Anderson Gomes,os ex-policiais militares Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz,detalharam o passo a passo do crime durante cinco dias de depoimentos. As declarações foram prestadas durante a audiência da ação penal contra os irmãos Domingos e Chiquinho Brazão — conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) e deputado federal — e o ex-chefe da Polícia Civil Rivaldo Barbosa,apontados como mandantes do crime,no Supremo Tribunal Federal (STF). No entanto,ainda há divergências nos relatos dos dois colaboradores,concluídos na semana passada.
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Lessa alegou que não compartilhava todos os detalhes com seu "compadre" Élcio,por ele não guardar segredos,o que explicaria as diferenças nas versões. No entanto,após tomar conhecimento de alguns trechos do depoimento do ex-sargento reformado da PM durante as sessões do STF,Élcio levantou dúvidas sobre alguns pontos do relato de seu amigo de mais de 30 anos. O blog Segredos do Crime também destaca algumas obscuridades na execução do crime contra Marielle e na tentativa de matar a ex-presidente do Salgueiro,Regina Céli. Saiba quais são:
Segundo Lessa,ao ser contratado pelos irmãos Brazão,seu amigo Edmilson de Oliveira Silva,o Macalé,lhe entregou a submetralhadora HK MP5 usada no assassinato da vereadora,já municiada. Após o crime,Lessa afirmou que,apesar de sua relutância,teve que ir à favela de Rio das Pedras,na Zona Oeste do Rio,reduto das milícias.
— Eu não estava entrando em Rio das Pedras porque havia tido um problema com o capitão Adriano (da Nóbrega,ex-chefe da milícia local). O Macalé sabia que eu tinha essa neurose com Rio das Pedras. Ele falou: 'Não,cara,é melhor a gente ir rápido e sair logo. Leva teu fuzil,é um momento delicado' — relatou Lessa. — Não tinha jeito. Não poderia ir a Rio das Pedras sem levar um fuzil. Coloquei o meu fuzilzinho no colo,parei onde ele (Macalé) havia combinado. Ele estava num carro um pouco à frente do meu. Macalé desceu com a bolsa (onde estava a submetralhadora) e eu apenas entreguei — contou Lessa.
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Já o delator Élcio apresentou uma versão diferente. Segundo ele,Lessa possuía sua própria HK MP5 e tinha grande ciúme da arma. Lessa teria dito a Élcio que "picotou" (serrou em pedaços) a arma após o crime e a jogou no Quebra-Mar,na Barra da Tijuca,utilizando um barco para garantir que os destroços fossem jogados em águas profundas. Lessa admitiu que teve uma HK MP5,mas insinuou que suas armas,como colecionador,desapareceram no dia 12 de março de 2019,quando foi preso. Mas tanto a Delegacia de Homicídios da Capital (DHC) quanto o Grupo de Atuação Especializada no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Rio (MPRJ) só apreenderam a pistola que ele portava nesse dia. O cofre da casa de Lessa,estava vazio.
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Quando questionado por um dos advogados dos réus se Lessa aceitaria usar uma arma entregue pelos mandantes,já municiada,Élcio respondeu,primeiramente,que não,mas se corrigiu:
— Acredito que ele só aceitaria se verificasse a arma por completo: desmontar,montar e até municiar. Ele é muito meticuloso,principalmente na questão de municiar. Ele possuía sua própria HK MP5 — disse Élcio.
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Ronnie Lessa também contou que,em uma das saídas para monitoramento e tentativa de execução de Regina Céli,ex-presidente da escola de samba Salgueiro,ele usou a mesma submetralhadora entregue pelos contratantes do assassinato de Marielle. O homicídio de Regina teria sido encomendado pelo contraventor Bernardo Bello,atualmente foragido. A questão levantada é o motivo de Lessa ter utilizado a arma fornecida pelos mandantes da morte de Marielle para outra execução.
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Segundo Lessa,ele "empurrou com a barriga" a execução de Regina,pois estava mais interessado no valor que receberia pelo assassinato de Marielle,uma soma milionária,cerca de R$ 25 milhões em lotes numa área de Jacarepaguá,que ele denominou Medellín 2.
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Na versão de Élcio,ele confirmou o uso da mesma arma nas duas situações. Segundo ele,Lessa tinha dito que,no dia da tentativa de assassinato de Regina,Maxwell Simões Corrêa,ex-bombeiro,dirigia o carro,enquanto Macalé estava no banco do carona com um fuzil AK-47,e Lessa,com sua HK MP5,ficou no banco de trás.
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Lessa relatou ainda que a arma usada no crime de Marielle foi entregue a Macalé por Robson Calixto Fonseca,ex-assessor de Domingos no TCE-RJ,e pelo miliciano Marcus Vinícius Reis dos Santos,conhecido como Fininho.
Outro ponto que não foi esclarecido diz respeito ao uso de um celular ponto a ponto — um aparelho utilizado para comunicação exclusiva entre dois interlocutores — entregue a Lessa pelo bicheiro Bernardo Bello. O assassino confesso utilizou esse telefone para acessar rotas de fuga por meio de um aplicativo de trânsito,após o assassinato de Marielle. A questão é similar à do uso da submetralhadora: por que o executor teria usado um recurso fornecido para uma missão específica em outro crime,encomendado por um contratante diferente?
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Essa dúvida permaneceu sem resposta,já que as defesas não levantaram o tema durante a audiência.
Os depoimentos prosseguem na audiência de instrução e julgamento do STF,com as testemunhas de defesa do conselheiro do TCE-RJ Domingos Brazão.
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