Tradicional reduto da boemia,inaugurado em 1907,o Armazém Senado,na Lapa — Foto: Luísa Giraldo
GERADO EM: 24/11/2024 - 22:29
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O samba impulsiona cada vez mais a cultura carioca. E o ritmo não faz bonito só no carnaval. A prova disso é o mapeamento feito pela prefeitura do Rio que cadastrou 150 rodas de samba espalhadas pela cidade — em 2021,no último levantamento,eram 95. Esses espaços de bamba têm direito até a certificação,entregue no último sábado durante uma comemoração no Museu do Amanhã,na Praça Mauá.
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Tradicional reduto da boemia,na Lapa,faz parte da lista. Um dos sócios da casa,Fernando Pires,de 58 anos,lembra que tudo começou com “um armazém português de secos e molhados”.
— O samba veio há uns 20 anos,quando a Lapa foi transformada. O comércio varejista foi desaparecendo na cidade. Começamos a fazer música e samba para segurar as pessoas — conta.
O Mapa das Rodas de Samba tem o objetivo de preservar as manifestações culturais no Rio,além de garantir aos eventos segurança jurídica ao desburocratizar a concessão de alvarás. O levantamento é atualizado a cada dois anos pela Secretaria Municipal de Cultura (SMC). Para o secretário Marcelo Calero,o programa tem sido efetivo porque estimulou o aumento desse movimento no Rio.
— As rodas de samba nunca deixaram de ser algo do cotidiano carioca. Porém,agora o produtor tem mais segurança jurídica. Isso,por sua vez,atrai mais parceiros. É um ciclo positivo que culmina com maior afluência de público e mais manifestações — destaca.
De acordo com o levantamento do município,a ginga e a batucada,normalmente em torno de uma mesa,estão espalhadas por toda a cidade,com 27,8% das rodas no Centro,25% na Tijuca e na Zona Sul,23,1% na Zona Norte (23,1%) e 20,8% na Zona Oeste. A cadência é menor na Barra e em Jacarepaguá,região que concentra apenas 3,2% do total.
Pesquisa mostra o perfil dos espaços — Foto: Editoria de Arte
Na Rua do Senado,a animação fica por conta da roda do Armazém às sextas-feiras quase que num happy hour — a partir das 17h. No sábado e no domingo,começa mais cedo,às 13h,atraindo o público que vai atrás dos garimpos na Feira do Lavradio,logo ali na esquina. Compositor e jornalista,Rubem Confete aprecia o movimento cultural há décadas. Aos 88 anos,é frequentador assíduo do Armazém,onde encontra “os amigos de toda uma vida” nos fins da semana. Morador de Vila Isabel,na Zona Norte,ele não abre mão da experiência de revê-los para falar sobre música ou simplesmente jogar conversa fora.
— Conheço as rodas de samba desde menino. Era um ponto de encontro social de alguns negros. Era muita luta e poucas pessoas. O samba foi crescendo e agora é assim — reflete.
A experiência também atrai turistas em busca de carioquices. A nutricionista argentina Nina Franchi,de 36 anos,que já visitou o Rio duas vezes,diz que não se cansa de explorar esse lado da cidade:
— Adoro a Lapa. As pessoas irradiam alegria e felicidade o tempo todo. É contagiante! Pretendo voltar aqui.
As rodas atraem um público diverso. Segundo o presidente da Rede de Rodas de Samba,Wanderso Luna,63% dos frequentadores têm diploma de ensino superior:
— O jovem na universidade quer ir a uma roda de samba porque ela tem o DNA do Rio. Elas atraem médicos,engenheiros. Hoje,a roda de samba é a vanguarda da cultura da cidade.
Segundo ele,no entanto,ainda é preciso conscientizar alguns organizadores desses eventos sobre a importância do cadastramento na prefeitura:
— Nossa luta é ampliar a participação. Muita gente não sabe que existe essa iniciativa e faz o evento na raça mesmo. Precisamos mostrar que eles podem alcançar essa política pública.
Filha do compositor Wilson Moreira,a pedagoga Andréa Moreira,de 56 anos,diz que sua relação com o samba “é de berço”. Quem a acompanha é a produtora cultural Geiza Kéti,de 62,filha do sambista Zé Kéti. Juntas,elas celebram os legados paternos a partir do projeto Herdeiras do Samba.
— Estamos muito felizes pelo reconhecimento da legitimidade na nossa roda de samba. Cada vez mais turistas vêm conhecer o samba original. É a nossa identidade nacional — diz Geiza,ao se apresentar no Armazém do Senado.
As duas “herdeiras” frisam que até mesmo o prefeito do Rio,Eduardo Paes,já passou pela casa de samba algumas vezes. Elas acreditam que “as novas gerações vão perpetuar o samba” feito por seus pais e muitos outros artistas.
— O samba é um bálsamo para a alma. Saio daqui bem. É nossa identidade. É o samba que nossos pais fizeram — finaliza Andréa.
Terreiro de Crioulo. A roda de samba agita Padre Miguel,na Zona Oeste: público participante aumentou após sua inclusão no mapa — Foto: Julio Moraes
Julio Moraes,que coordena o Terreiro de Crioulo,em Padre Miguel,na Zona Oeste,diz que a inclusão da roda de samba no mapa da prefeitura levou a um aumento de público.
— Recebemos 13 mil pessoas no festival do Dia da Consciência Negra. Até pouco tempo atrás,estávamos acostumados com rodas de mil pessoas — ressalta.
Organizador do Time de Crioulo,na Glória,na Zona Sul,Pipa Vieira também reconhece a importância da iniciativa:
— Dessa forma,salvaguardamos nossa cultura. O samba é o grande poder transformador,tanto econômico como cultural.
* Estagiária sob supervisão de Giampaolo Morgado Braga
© Reportagem diária do entretenimento brasileiro