Vista aérea de São Paulo. — Foto: (Reprodução/Pexels/Kelly)
GERADO EM: 25/07/2024 - 04:30
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Cultivo uma relação complexa com São Paulo. Tenho amigos queridos na cidade,meu trabalho é sempre muito bem acolhido,há um circuito com tudo que adoro (restaurantes,teatros,museus,hospitais — não necessariamente nessa ordem). Ao contrário de muita gente,não acho a cidade dura,inóspita,hostil. Até os dez graus do inverno me agradam. De minha parte,é só amor. Mas ao mesmo tempo que a amo,não a domino. O Rio é mais fácil: é uma cidade dada. São Paulo não,precisa ser conquistada.
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Uma vez me disseram que um ator carioca pediu para sair da temporada paulista de uma produção teatral por uma razão inusitada: não sabia onde a cidade acabava. Entendo esse sentimento. No Rio,o fim está posto. Em São Paulo,não. Há sempre uma nova Vila-não-sei-que-lá à frente. Na cidade onde tudo é superlativo,se achar é um desafio. Para quem,como eu,já veio ao mundo com o senso de direção avariado de fábrica,é ainda pior. Se alguma vez me ouvir dizendo que o caminho é pra lá,pode ter certeza: é o extremo oposto do sugerido. E isso vale para qualquer cidade.
Mas eis que o trabalho novamente me leva para São Paulo. Por dez dias consecutivos,táxis me levaram da Avenida Paulista ao teatro. Em nenhuma das vezes a corrida foi pelo mesmo caminho. Em uma delas,o motorista perguntou: quer ir por dentro ou por fora? Minha vontade foi de simular um desmaio e apenas me deixar levar,numa espécie de sequestro relâmpago consentido. Por dentro de quem? Por fora de onde? Pensei rápido e arrisquei um “o que o senhor achar mais rápido”,ao que ele apenas respondeu: “Ah,então é por dentro com certeza”. Ainda não sei a que ele se referia.
No entanto,a falta de direção também traz algumas vantagens: para quem não sabe onde está,tudo é perto. No mesmo dia,sou capaz de almoçar mussaká com cerveja grega no Acrópoles,no Bom Retiro,conferir uma exposição no Sesc Ipiranga,assistir a uma peça no Belenzinho e fechar o dia na Dona Onça,no Centro. Como não sei onde estou indo,apenas vou. Horas no trânsito,achando tudo normal — tour de force que ninguém faz na sua própria cidade —,admirando pela janela,a cada nova curva. A Liberdade que leva ao Paraíso.
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De passagem pelo Pacaembu a caminho de Perdizes (aos poucos eu aprendo),uma senhora atirava migalhas de pão velho às galinhas,soltas em uma pracinha,alheia às pessoas que passavam. A imagem era surreal em meio à magnitude da cidade que a cerca. Parecia uma cena bucólica de cidade do interior e não de uma das maiores megalópoles do mundo. Talvez,no fundo,as cidades sejam todas iguais,a depender a pena dos olhos de quem as vê.
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Mas se São Paulo assusta,também pega no colo. A genial Denise Fraga está em cartaz na cidade com “O que só sabemos juntos”,ao lado do gigantesco Tony Ramos. Tony é um desses atores que estão dentro das nossas casas desde sempre,trazidos pela televisão. Seu recente contratempo de saúde comprovou o que todo mundo já sabia: Tony Ramos é uma paixão nacional. Sua presença em cena é arrebatadora. A dupla chega em breve ao Rio e assisti-los é uma emoção imperdível.
© Reportagem diária do entretenimento brasileiro