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'Não estamos no cenário desejado para a vacinação, mas é bem diferente do que já vivemos', diz coordenadora do Unicef

Jul 23, 2024 Tecnologia IDOPRESS

Luciana Phebo: coordenadora de saúde do Unicef — Foto: Divulgação

RESUMO

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GERADO EM: 23/07/2024 - 04:30

Avanços na Vacinação Infantil no Brasil: Desafios e Estratégias

O Brasil melhorou indicadores de vacinação infantil,reduzindo número de crianças sem vacina DTP1. Luciana Phebo,do Unicef,destaca avanços,importância de incluir crianças nas conversas sobre imunização e estratégias para convencer familiares hesitantes. Desafio: alcançar meta de 95% de cobertura e zero crianças sem vacina. Combate à hesitação: abordagens personalizadas e baseadas em ciência,envolvimento da comunidade e conscientização sobre proteção coletiva e individual.

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Um novo relatório divulgado pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef) e pela Organização Mundial de Saúde (OMS) mostrou que o Brasil finalmente melhorou seus indicadores de vacinação infantil,após anos de uma indesejada redução — o que colocaria o país vulnerável para surtos de doenças graves para meninos e meninas. De acordo com o material,o número de crianças que não receberam a aplicação de vacina DTP1 (que protege contra a difteria,tétano e coqueluche) caiu de 687 mil no ano de 2021 para 103 mil em 2023.

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Historicamente esse imunizante serve de termômetro para outras vacinas infantis,daí a importância de observar o aumento de sua prevalência. As crianças que não receberam essa vacina,por exemplo,são consideradas (de acordo com a nomenclatura médica) de “zero dose”,pois na falta da DTP,indicadores matemáticos sugerem,com bastante precisão,que aquela criança não recebeu nenhuma outra vacina,um cenário bastante alarmante. Embora a melhoria nos indicadores brasileiros inspire comemorações,a chefe de Saúde do Unicef Brasil,Luciana Phebo,diz que é preciso avançar ainda mais. Em entrevista,a coordenadora da entidade fala sobre os caminhos para melhorar a adesão aos imunizantes,da importância de incluir as crianças nas conversas sobre vacinação e como falar com os parentes hesitantes em aplicar as doses.

O Brasil melhorou sua posição no ranking de vacinação,saiu da lista dos 20 países com mais crianças sem imunização no mundo. Estamos no patamar desejado para a imunização?


Não estamos no cenário desejado para a vacinação,mas é bem diferente do que já vivemos. Desde 2015,as coberturas vacinais do Brasil começaram a diminuir. E isso é um risco muito grande para o país,além de ser um risco individual. Pois há o perigo da criança adoecer e morrer,afinal a imunização diz respeito a doenças graves,que matam. É um problema muito grande também para o país,que pode ver o retorno de surtos frequentes de doenças sérias como o sarampo. Desde 2015,as coberturas estavam caindo e,com a pandemia,o que era grave ficou mais grave ainda. Esse mesmo estudo mostra que a cobertura vacinal de crianças foi afetada em todo o mundo. Isso porque os profissionais de saúde não tinham tempo de mais nada do que impedir que as pessoas morressem de Covid-19. Nos países com o sistema de saúde mais organizado,porém,essa recuperação foi mais rápida. Nós patinamos depois da pandemia,mas agora estamos demonstrando um avanço.

O que aconteceu no Brasil para que os indicadores finalmente melhorassem?


O nosso avanço pode ser explicado na prioridade política do governo federal em vacinar crianças. Isso junto de recursos,com orçamento,e profissionais capacitados,além de metodologia acertada. Isso faz a maior diferença. A sociedade civil e as entidades médicas também tiveram seu papel,além da divulgação. A vacinação tem mesmo que ser um assunto de todo mundo,não só de governo.

O número de crianças que não receberam nenhuma dose da vacina DTP1 ainda são 103 mil,qual é o número que deveríamos buscar?


A meta das vacinas,em geral,é 95%. Porque isso permite a proteção coletiva. Agora,se você me perguntar a meta do número de crianças que nunca tomaram vacina é zero. Aqui,no Unicef,trabalhamos pelo direito da criança e do adolescente,e não tem como eu te falar que “tudo bem” ter três crianças que nunca tomaram vacina no país. Não podemos deixar nenhuma criança para trás. Mesmo que consigamos atingir os 95%,de cobertura,não podemos deixar para lá. Temos que achar todos,até porque as crianças que não receberam todas as vacinas são as mais vulneráveis. E não só do ponto de vista da doença,mas porque muito provavelmente ela pode ter outros direitos violados,como por exemplo estar fora da escola.

O que explica a hesitação vacinal no Brasil ter ganhado força? Pois o movimento antivacina ainda é iniciante no país…


Mesmo antes da desinformação,das fake news,vivemos outra coisa em 2015. A vacinação teve seu sucesso como um tipo de vilão. O Brasil tem reconhecidamente seu programa de vacinação como um dos melhores do mundo,nossas coberturas vacinais até 2015 eram de dar inveja,um sucesso mundial. Então,as doenças que as vacinas protegem foram sumindo da nossa visão,do imaginário brasileiro. Jovens nunca viram crianças com paralisia infantil. Eu vi na minha infância e nunca me esqueci. Era um terror de pai e mãe,seja qual for a classe,ver a poliomielite. A pandemia também trouxe uma piora de indicadores,por conta da sobrecarga dos profissionais de saúde e dos sistemas. Em países de baixa renda ou de renda média,o que mais afeta os indicadores é o acesso à vacina,às unidades de saúde. Em países de renda mais alta,o acesso não afeta tanto,mas enfrenta-se a fake news,desinformação e os antivacinas. Aqui é um pouco de tudo,para o bem e para o mal.

A chegada das crianças ao posto de saúde para vacinar-se também é importante,certo?


A vacinação é o momento em que o profissional de saúde encontra a criança. É a porta de entrada para que se perceba diversas questões de saúde. É um momento em que pode ser percebido,um caso de desnutrição. A vacina,no Brasil,é porta de entrada para o serviço de saúde. Além do que a prevenção de infecções protege crianças de prejuízos de aprendizagem,porque evita que ela fique doente e precise se ausentar da escola.

Ouvimos muitos relatos de famílias que estão divididas por descrença na vacina. Como podemos convencer parentes antivacina a mudar de ideia?


Estamos aprendendo,mas hoje sabemos que para conversar com cada grupo populacional é preciso uma abordagem diferente. Para falar com seu cunhado,será de um jeito,para mãe trabalhadora,moradora de favela,é diferente. Indígenas e quilombolas também. Isso porque a vacina tem a ver com o comportamento social em que a pessoa está inserida. Para todos os casos,não dá para ter achismos,coisas que eu penso e que eu acho. Tem que ser formatado com o linguajar,a cultura e o entendimento daquela pessoa,mas sem achismos,opiniões,é preciso estar baseado em ciência.

Então para convencer a cunhada que não vacina é preciso estudar…


Você precisa estar muito baseado em ciência para ter essa conversa,mas não adianta entregar um paper científico que não vai funcionar. É interessante a comunicação entre pares também. Então a conversa com uma pessoa próxima,com faixa etária semelhante (no convencimento em prol da vacinação). Porque aquela pessoa pode se ver no outro,na forma de ser,de viver,de se vestir,de pensar o mundo. Nós trabalhamos muito com a juventude,para que os jovens possam conversar com outros pais,que nunca viram a poliomielite. Existem,ainda,outras figuras que inspiram autoridade maior entre outros,o profissional de saúde é um deles,sobretudo o pediatra.

Falar da doença também funciona?


Funciona,temos que falar. Além de falarmos da doença,é preciso convidar as pessoas que conviveram com a doença a falar. No caso da poliomielite,é importante saber das experiências de um adulto que vive com sequelas por não ter se vacinado. As mulheres que enfrentaram o câncer de colo de útero,por estar sem a vacina do HPV,também podem ser ouvidas nesse caso.

O que é preciso fazer para aumentar a vacinação ainda mais no Brasil?


É preciso ir atrás das crianças que estão sem vacina. A saúde precisa operar além dos muros das unidades de saúde. É preciso que se valorize o agente comunitário de saúde,valorizar quem faz a visita domiciliar,para conhecer a situação do território. Além disso,também é importante dar o valor necessário profissionais de saúde primária,além da estratégia de saúde da família. É necessário ainda fortalecer o Programa Saúde na Escola (PSE),pois essa união entre saúde e educação é fundamental.

Como engajar as crianças nessa tarefa,dá para incluí-las na conversa da imunização?


Devemos incluir a criança nessa conversa. A vacinação é um ato de proteção,quando a gente fala para um menino ou menina pequenininho “não converse com pessoas estranhas”,é uma forma de dar informação para que ela se proteja. Então,quando você fala: olha a “picadinha”,em um braço,é para proteger de algo que fará mal para você,acontece o mesmo mecanismo. Para a criança é muito importante saber que os adultos querem protegê-la,inclusive para sua autoestima,para crescer confiante,é importante saber que há preocupação que ela esteja saudável. Talvez seja complexo explicar,mas é importante informá-la de que ao tomar a vacina ela também protege os amiguinhos. É muito bom oferecer desde cedo essa ideia de colaboração com os outros e (oferecer) a ideia de que ela faz parte de um todo. É importante saber que colaboram com a comunidade. Não é história de fadas,ao se vacinar elas protegem suas escolas,sua comunidade.

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