Milhem Cortaz retorna às novelas em 'Volta por cima',como o vilão Osmar — Foto: Ana Branco
GERADO EM: 07/09/2024 - 05:00
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Milhem Cortaz gargalha ao falar de seu novo personagem,o vilão “boa-praça” Osmar,da próxima novela das 7 da Globo,“Volta por cima”,que estreia dia 30. “É um cara cheio de nuances. Se esforça,mas as coisas não dão certo para ele”,diz. O trabalho reflete um momento solar e de leveza do ator paulistano de 51 anos,que em três décadas de carreira,completadas em 2024,já caminhou muito pelas sombras. “Os 50 trouxeram uma elegância. Meus defeitos estão mais claros,como o machismo estrutural,o temperamento”,explica,em uma hora e meia de entrevista por chamada de vídeo. “Mas ainda sou inseguro. Às vezes,somos muito sinceros,estou aprendendo a cuidar do que falo. Queria que os títulos de matérias sobre mim começassem com uma palavra de amor,e nem sempre de superação.”
Conhecido por trabalhos memoráveis nos filmes “Carandiru” (2003) e“Tropa de elite” (2007),na série “Os outros”,(2023) e em mais de 15 novelas e 10 peças,Milhem tem uma história de batalhas e “voltas por cima” difíceis de ignorar. Todas elas — da síndrome do pânico ao vício em cocaína — foram superadas com o apoio da família,de amigos e da companheira há 24 anos,a atriz e produtora Ziza Brisola. Juntos,tiveram uma filha,Helena,de 16,tornando realidade o grande sonho do ator. “Sempre quis ter uma família”,admite.
A seguir,ele relembra momentos de crise e de sucesso,e fala de seu xodó,a padaria Cortaz,o Pão,criada na pandemia na garagem de casa,em São Paulo.
Milhem Cortaz: 'Eu e Ziza queremos que a Helena tenha liberdade' — Foto: Ana Branco
Qual a sua grande volta por cima?
No clipe da novela,as pessoas estão otimistas,felizes. Estou nesse momento. Hoje em dia,é saber ceder. Se não tivesse a humildade e a sabedoria de mudar conceitos,não acompanharia a educação da minha filha.
Como é ser pai de uma adolescente?
Helena é de uma geração sem julgamentos. Não tem o menor problema em experimentar tipos diferentes de relacionamento,é livre para absolutamente tudo. Eu e Ziza queremos que ela tenha essa liberdade. Mas,para isso,temos que estar presentes,protegendo-a do abismo.
Você já disse ter usado cocaína na adolescência e vivido no abismo. o que leva de positivo da experiência?
Vivi na dor e trouxe uma poesia,uma fortaleza para minha vida. Descobri que sou compulsivo com tudo,e a luta me deu limites,não sei se isso teria acontecido sem ter ido ao fundo do poço. Na lei do livre-arbítrio,paguei o preço e aprendi com as escolhas.
Na época,você disse que teve um encontro com Deus ao abandonar o vício. Tem religião?
Eu sou católico,de formação também do candomblé,minha família era do candomblé,hoje ela é inteira da igreja. Esse é o grande déficit da minha vida,sou super de fé,carrego um pouco de cada uma delas,mas quero achar um lugar em que encontre meu ritual,que eu pare meu tempo para aquilo. Trabalhar o lado espiritual é muito importante,independentemente de qual caminho você escolher. E aprendi pelo budismo a me livrar da culpa.
É a favor da discriminalização das drogas?
Sou a favor do cannabis,que é algo que está em pauta hoje. A medicina tá aí,mostrando pra todo mundo. Eu não tenho nem como discutir,só se eu for um cara fechado,que não vive com a Ziza,a Helena,com o mundo,pra me fechar pra isso. As drogas são um problema enorme porque nao é visto como (algo relacionado à) saúde,é visto como crime. Então tem muitos caminhos para discutir,a conversa é complexa.
Montou sua padaria na pandemia. Na época,disse que estava sensível,insatisfeito... Viveu uma crise existencial?
Não. Tive um problema pessoal familiar complexo e muito íntimo,que jamais exporia. Na pandemia,fui obrigado a parar. Pensei: ‘o que quero fazer depois dos 50?’. Sou de uma família de comerciantes. A panificação surgiu muito forte,e a Ziza disse que meus pães eram excelentes. Tendo sucesso ou não como ator,queria ter um negócio.
O ator celebra 30 anos de carreira e relembra dores e delícias de sua trajetória — Foto: Ana Branco
Faz terapia?
Sim,da linha bionergética,que envolve o corpo,respiração. Se deixar,eu vou falando tanto que até me confundo. Por isso a arte é tão importante,porque não sou nada racional. Costumo dizer para que ser louco,tem que ser muito organizado.
Qual é o melhor e o pior de um casamento tão longevo como o seu?
A parte boa é o amor. E a parte ruim é magoar e decepcionar o outro. Eu odeio decepcionar a Ziza!
Já repensaram a relação? são monogâmicos?
A gente já repensou e tentou de tudo! Hoje em dia,para acabar,só se faltar tesão. E nada deixa a gente com mais tesão do que a cumplicidade. Já vivemos todas as crises,todos os ciúmes,e isso só nos fortalece. Vou terminar a minha vida com ela e “transudão” (gargalhadas).
Você conviveu quase 30 anos com a síndrome do pânico. Quais eram seus gatilhos?
Qualquer coisa. A maneira como eu acordava,uma pergunta que me fizessem. É a pior coisa que já vivi. Cheguei em um lugar próximo das pessoas que já tentaram se matar,mas sou um covarde e não faria isso. A natação me ajudou a controlar a respiração,a ansiedade. No começo,achei que ia morrer,mas depois,a vida voltava ao normal. A piscina era o útero da minha mãe. Nunca mais parei.
© Reportagem diária do entretenimento brasileiro